«Era uma vez ….…………….. FIM»
"Capítulo 1
Naquele intervalo entre o “Era uma vez” e o “FIM” passou-se muita coisa.
Eu vivia tranquila numa cidade africana à beira mar. Tinha uma praia enorme, quilómetros de praia! Começava numa ponta e… não tinha fim à vista. Ultrapassava os limites da cidade.
Eu ia à praia no dia da folga, à 5ª feira. Apanhava um escaldão pela manhã, ia a casa tomar banho, depois, almoçar fora. A seguir ao almoço, uma matinée, seguida de um passeio e o dia de folga terminava com um jantar numa petisqueira. Que lindo! Que boa vida!
No dia seguinte às 7 da manhã já estava no emprego. Os colegas em fila, aguardavam que eu abrisse o cofre da Recepção onde estavam as chaves de todas as secções do Hotel: Tabacaria, Cabeleireiro, Salsicharia, Lavandaria, Bar, Salão de Chá, Restaurante Self-Service, Restaurante da Esplanada da Praia, Supermercado e Posto dos Correios. Também havia uma dependência bancária mas essa chave eu não tinha no ‘meu’ cofre. Ah! Havia também um Armazém e uma Garagem. Eu também não tinha essas chaves…
Os colegas desapareciam todos como formigas a caminho das respectivas áreas de trabalho. A seguir chegavam as senhoras encarregadas das limpezas dos quartos que vinham buscar as “listras” (assim lhes chamavam) com indicação dos quartos que iam vagar nesse dia e que tinham prioridade na limpeza, para dar entrada a novos hóspedes.
E, claro, havia os hóspedes. Danadinhos, madrugadores, às 7h05 já estavam na Recepção para pedir qualquer coisa! Uma almofada, um cobertor, uma ventoinha… um pano encharcado nas ventas!!! Alguns deles bem precisavam! Vinham queixar-se do calor! Ou então de que a água do mar estava suja ou fria ou quente ou sei lá o quê!! “E a que horas é a maré baixa?” “E a que horas é a maré alta?” “E a que horas é o pôr do sol?” “E a que horas é o nascer do sol?” – é incrível o tipo de perguntas que um hóspede de hotel faz quando não tem mais nada que fazer!
E eu, sempre de sorriso ‘em punho’, amavelmente respondia a cada um, desejava um bom dia, boa estadia e passava ao seguinte: “Good morning! Can I help you??” (smile!!!) … e assim continuava até às 13h… hora de fechar a Caixa e verificar que faltava dinheiro! Quase todos os dias faltava dinheiro na Caixa! Era um tormento! Trabalhávamos com várias divisas e tínhamos que fazer o câmbio na hora… às vezes, lá nos enganávamos e era sempre a favor do cliente, caramba!!! Sim, porque quando era contra o cliente, ele dava logo conta, ora pois!
Mas a falta de dinheiro na Caixa era um suplício constante! Mais tarde (depois da mudança política …) viemos a saber que era o patrão que nos tirava dinheiro às escondidas para nos provar que não podíamos confiar em ninguém quando nos ausentávamos da Recepção por um momento que fosse e não fechávamos a Caixa à chave!… ora quem ia desconfiar do patrão, não é??? E ele aproveitava-se, o malvado! Também, já morreu e deixou cá tudo... "
Continuação...
A falta de dinheiro na Caixa era uma constante. De vez em quando lá sobravam uns trocos, mas o pavor que sentíamos na hora de fechar contas, era enorme. Reclamámos junto da gerente e do patrão, alguma coisa se devia passar pois tínhamos sempre muito cuidado com os trocos e com a Caixa, sempre fechada, etc, mas desconfiávamos que a mesma se conseguiria abrir sem a chave, enfim, protestámos muito, mas resultados, nenhuns! Volta e meia, continuava a faltar-nos dinheiro na Caixa.
A minha colega Isabel, sempre muito expedita, disse “Temos que arranjar uma maneira de resolver isto!! Todos os meses parte do salário vai para a Caixa!! Isto não pode continuar!!”
Pensámos, pensámos, pensámos e concluímos que… alguém nos tirava dinheiro, devia haver alguma maneira para abrir a caixa sem a chave ou algo do género! Por isso… “ladrão que rouba a ladrão, tem 100 anos de perdão”.
E tomámos uma decisão. O Hotel tinha anexo um Acampamento para tendas, caravanas e bungalows, e alugávamos loiças, cobertores, etc, a quem ficasse no acampamento. À partida do cliente, este devolvia as coisas e pagava um determinado valor por cada item alugado, vezes os dias que os tinha usado. Aí, nós passávamos um Talão, como comprovativo do pagamento desse aluguer.
Decidimos que, quando faltasse dinheiro na Caixa, não passaríamos o tal Talão, até perfazer o valor em falta. Fazíamos as contas num papelinho qualquer e o cliente, como estava de partida e não precisava do Talão comprovativo do pagamento do aluguer, nem se lembrava disso, pagava e ia-se embora sem o Talão. Assim, o dinheiro entrava na Caixa sem documento – portanto, roubo descarado ao patrão. Mas tínhamos que nos defender de alguma maneira. Jurámos uma à outra, que nunca o confessaríamos, só se nos arrancassem as unhas a sangue frio! Felizmente nunca foi necessário confessar! E assim, com esta estratégia, conseguimos regularizar uma situação que se estava a tornar desastrosa.
Em boa hora o fizemos pois, mais tarde, viemos a saber que era o próprio patrão que nos tirava o dinheiro da Caixa. Aparecia na Recepção e dizia, por exemplo: “Quem são aqueles senhores que entraram para o Salão de Chá?” – “Não sei…” – “Então vá lá ver, disfarçadamente…” – Ou então “Esqueci-me das chaves na secretária, sff, vá busca-las” – E nós íamos, claro, deixando a Recepção à “guarda” do patrão! E ele aproveitava para nos tirar dinheiro, com a desculpa que nós tínhamos que aprender a não confiar em ninguém! E ameaçava os porteiros de os despedir se dissessem algo! Claro que mais tarde, depois da mudança do regime, os porteiros contaram-nos tudo.
Em boa hora o fizemos pois, mais tarde, viemos a saber que era o próprio patrão que nos tirava o dinheiro da Caixa. Aparecia na Recepção e dizia, por exemplo: “Quem são aqueles senhores que entraram para o Salão de Chá?” – “Não sei…” – “Então vá lá ver, disfarçadamente…” – Ou então “Esqueci-me das chaves na secretária, sff, vá busca-las” – E nós íamos, claro, deixando a Recepção à “guarda” do patrão! E ele aproveitava para nos tirar dinheiro, com a desculpa que nós tínhamos que aprender a não confiar em ninguém! E ameaçava os porteiros de os despedir se dissessem algo! Claro que mais tarde, depois da mudança do regime, os porteiros contaram-nos tudo.
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